Uiá!!

"Nascidos, nós choramos por chegar a esse palco de tolos". Shakespeare, Rei Lear.

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Local: Londrina, Paraná, Brazil

10.12.07

O pato, a inveja e tudo mais

Eis que após um longo inverno brilha novamente (ou escurece) a estrela anã que regularmente (ou não) escreve coisas e mais coisas aqui nestes lados anárquicos e livres da era digital (internet).
Em outros tempos, épocas passadas, brotou em mim a intenção de redigir uma pequena resenha sobre os patos. Algumas semanas atrás, conversando com um amigo meu, ele me falou para escrever sobre os patos, a inveja e tudo mais; "tudo mais" referindo-se à arrogância.
Adimplindo ao requerimento à mim feito por esse caro amigo, discursarei, brevemente sobre o pato e, talvez, pormenorizadamente sobre os outros dois; ou quem sabe o oposto seja perpetrado, não tenho como dizer agora, posto que o texto não foi pré-produzido e, portanto, não há forma delimitada para ele e, dessarte, seus contornos serão definidos conforme o escrevo.
Pois bem, o pato. Já povoou nosso imaginário infantil inúmeras vezes através dos desenhos que nos hipnotizavam nas tardes quentes e alegres da nossa puerícia, através do Pato Donald e do Patolino, embora, em verdade talvez o Pato Donald seja na verdade um Marreco, espécie diferente do pato que emite outros tipos de som e tem características físicas diferentes; entretanto, para não manchar a imagem captada pelo obturador ocular e gravada na memória manteremos a classificação do Donald como Pato.
Esse ser aquático pode ser classificado como polivalente. Ele anda, nada e voa e não faz nenhuma das três coisas bem. Ora, consideremos que o pato não tem o encefálo desenvolvido, não podendo, portanto, entender o meio que o rodeia e, muito menos, si próprio. Ou seja, ao contrário de nós, humanos seres, o Donald não tem consciência de si mesmo; ele é um ser ontológico (é o que é). Isso posto, podemos dizer que ele não faz essas três coisas (andar, nadar e voar) porquê um dia sentiu vontade e resolveu testar os limites da sua existência; ele o faz porquê assim foi programado através de um processo evolutivo (ou, para não enfurecer os adeptos das teorias criacionistas e do desenho inteligente, foi feito assim por uma força superior) e assim melhor se adaptou ao meio que o rodeia; entretanto, como regra no mundo animal, quanto mais especializado em alguma atividade for um ser, maiores chances ele terá de triunfar na luta pela sobrevivência (tenho assistido muito National Geographic e Discovery...).
Vide os leões, gaviões e etc., peritos que são nas artes de andar, correr e voar conseguem de maneira majestoso realizar seus misteres; por isso, dividindo como o faz, o pato é um ser engraçado, bonitinho e desajeitado nos seus afazeres animalescos não tendo condições de competir com os seres doutores nas três artes que ele pretende fazer.
Não quero dizer, entretanto, que a diversidade de funções e afazeres pode comprometer a vida do pato. Não há como se pensar nisso porque durante um longo processo evolutivo (ou criativo...) ele tomou essa forma, pois foi a melhor adaptada a sobreviver no meio no quel ele se inseria e está contido até hoje.
Percebam, portanto, que em termos sociais, nós, humanos que somos, somos patolinos da vida real. Ou "donalds" às avessas.
Durante muito tempo, no decorrer da história documentada e estudada, houve homens que possuiam uma gama absurda de conhecimento; que enveredavam pelos caminhos da matemática, filosofia, história, biologia, direito, medicina, contabilidade, literatua, física, quimíca, etc., e não deixavam a desejar em nenhuma delas, aí vocês me perguntam: hein? como assim? isso é (foi) possível?
Ora pois, mas é claro ó pá! Inúmeros nomes cultuados e venerados pelas ciências foram, em outras épocas, grandes literatos ou grandes filósofos ou tudo numa coisa só. Da Vinci, Newton, Platão, Aristóteles, Heráclito, Galileu, Copérnico e por aí vaí; há uma longa lista de celebridades póstumas que navegaram e desbravaram vastas áreas do conhecimento, eram como "patos sociais", porém, ao contrário, conseguiam realizar bem suas tarefas.
Porém, como nem tudo é flores nas terras homínidas, em determinado ponto da evolução social, requereu-se dos homo sapiens que a especialização deveria ser a fonte de todo conhecimento buscado; ou pelo menos uma especialização relativa onde se permite que nós, parentes dos macacos, possamos nos singularizar em duas ou três materias. Eis porquê hoje há tantos mestrados, doutorados, pós-doutorados e tanta propaganda sendo bombardeada nas nossas jovens mentes para que nos distingamos dos demais sendo sempre, cada vez mais, doutores nisto e naquilo, deixando de lado outras áreas importantes do conhecimento.
Não que isso seja ruim; em uma sociedade complexa como a nossa o correto, penso, seja realmente essa partição de conhecimento, com diversas e intricadas áreas com seus especialistas e doutores.
Ademais, é cada vez mais díficil criar-se uma teoria nova para explicar algo já fastidiosamente lecionado e destrinchado; se pararmos para ver o lugar que nossas indagações nos levam, eles - os lochi -, já foram anteriormente explorados com muita propriedade e argúcia, tornando, portanto, complicada a nossa situação atual como criadores de pensamentos; somos mais como analistas e ensaístas, buscando sempre trazer à baila uma explicação nova e fascinante para um fenomêno já explicado de maneira fascinante; percebam o embaraço que se põe à nossa frente.
Conclui-se, portanto, que os patos não tem um lugar especial na nossa sociedade, ou em parte dela, porém, assim como aqueles da natureza, a evolução social resguardou um lugar para os "poliglotas do conhecimento", mesmo que esse sítio não seja doce e suave, esta lá, atrás das paredes de concreto, dos muros da ignorância e dos arbustos da especialização.
Eis que partiríamos agora para a outra parte dessa divagação, contudo o texto discorrido já resta demasiado longo e, portanto, me cumpre dar-lhe cabo sem prolongá-lo.
A inveja e a arrogância nos transformam em patos mal formados e mal preparados; se precisamos de outrem para exercitar nosso poder de maneira vexatória ou de alguém para servir de espelho para atingirmos nossos objetivos de forma ignóbil, quiçá não merecemos os privilégios dos quais somos portadores e defensores.
Ao exercitarmos essas duas formas de conduta (inveja e arrogância) nos transformamos em seres humanos, tal quais patos, mas humanos. E é só isso que tenho a dizer.

Mais, até ver; leitores invejosos.